
O estado da arte | A Filosofia na cidade – Edição 2025
PROGRAMA
Sessão 1 | 5 maio 2025 | 21h00
Urbanismo, por David Pinho (Professor do ensino secundário)
Tales não assistiu à destruição de Mileto pelos persas em 494 a.C., nem à sua reconstrução por Hipódamo, que redesenhou a cidade segundo um rigoroso plano geométrico, conhecido como o primeiro plano ortogonal ou hipodâmico. Entre o nascimento da filosofia e o do urbanismo racional medeia um século. Nesta colónia grega na Ásia Menor, em cem anos, tentou-se submeter, pela razão, a physis cósmica e a habitada. Não sabemos o que Tales pensaria da nova Mileto, mas provavelmente, apesar da admiração pela geometria, sentiria nostalgia pela antiga Mileto.
Enquanto se reconstrói Mileto, Sócrates vagueia pelas ruas de Atenas, semeando nas consciências dos seus concidadãos novas questões. Não é exagero poético dizer que Sócrates era Atenas. A filosofia sempre emanou das cidades, mas, apesar do vasto legado acumulado, frequentemente ignorou o ambiente urbano. Platão, Thomas More, Campanella e Francis Bacon idealizaram cidades como Kallipolis, Utopia, Cidade do Sol e Nova Atlântida, mas todas elas feitas da mesma matéria de que os sonhos são feitos.
Quando a filosofia voltou à cidade real como Manchester (Marx) ou Paris (Henri Lefebvre e Walter Benjamin), encontrou, a partir daí, o campo urbano tomado pela história, sociologia, antropologia, geografia e urbanismo. Estas disciplinas, pioneiras na questão urbana, influenciaram a filosofia da cidade, exigindo desta uma revisão epistemológica contínua. Além disso, parte da filosofia envolveu-se civicamente em questões sociais, ambientais e urbanas, como habitação, mobilidade e património cultural. É desta filosofia de rua, reflexiva e comprometida ao mesmo tempo, que vos falarei.
Sessão 2 | 12 maio 2025 | 21h00
A Filosofia da Cidade, por Paula Cristina Pereira (FLUP)
Porque deve a cidade interessar (de novo) à Filosofia? A cidade não foi sempre objeto da Filosofia?
Considerar que a filosofia é um fenómeno urbano, permite afirmar que a cidade é um fenómeno de particular relevância filosófica?
A cidade nunca deixou de ser uma entidade política porque, enquanto potenciadora de espaços públicos, é onde, de modo singular, se pode construir a democracia. No entanto, os interesses normativos e jurídicos marcaram boa parte do pensamento sobre a cidade. E ainda que os estudos urbanos, desde 1960, lhe tenham dado atenção, poucos filósofos consideraram empreender uma reflexão sobre o urbano e a cidade, como Lefebvre (1967), Young (1990) ou Arendt (1958).
Hoje, assistimos ao interesse crescente pela filosofia da cidade, evidente nas abordagens multidisciplinares das ciências sociais e como área da Filosofia.
Considerando a heterogeneidade económica, social, espacial, ambiental e política dos fenómenos urbanos, a filosofia da cidade, ao procurar compreender as relações entre o cidadão, a política e o espaço, pode constituir um importante contributo para abrir a Filosofia, nomeadamente a filosofia política, a uma renovada conceção do político, que supere o transcendentalismo da soberania herdado da modernidade pela imanência do político no social (Negri) e, portanto, a necessária espacialização do pensamento como fundamental para pensarmos e respondermos a um dos maiores desafios do presente e do futuro: as implicações de um planeta excessivamente urbano.
As previsões apontam que em 2050, 80% da população mundial viverá nas cidades. Estes dados concorrem, desde logo, para evidenciar o papel político e social das cidades. Os atuais espaços urbanos estão marcados por um grau sem precedentes de descontinuidade e interconexão transversal de todos os âmbitos (materiais e imateriais) que definem a vida social e política (Pereira & Urabayen). Compreender adequadamente a realidade política atual implica, pois, refletir sobre as cidades e sobre a condição urbana contemporânea.
Sessão 3 | 19 maio 2025 | 21h00
Cidade Inteligente e Inclusiva: Espaços Verdes, Big Data e Ética Urbana, por António Rochette (FLUC)
No debate contemporâneo sobre a estética urbana, a integração da biofilia revela-se essencial para uma compreensão ampliada da beleza, da funcionalidade e da ética das cidades. A beleza urbana já não pode ser entendida apenas como forma ou ornamento: ela emerge da capacidade dos espaços de promover bem-estar, pertença e resiliência às alterações climáticas. Neste cenário, os espaços públicos verdes assumem um papel central, funcionando não apenas como expressões estéticas, mas como infraestruturas críticas para a regulação ambiental e a qualidade de vida urbana.
No contexto das cidades inteligentes, em que a inovação tecnológica redefine a gestão dos serviços urbanos, a inclusão torna-se um imperativo ético. A criação e gestão de espaços verdes devem incorporar princípios de acessibilidade universal, participação cidadã e equidade ecológica, garantindo que todos — independentemente da idade, mobilidade ou condição social — usufruam dos benefícios da natureza na cidade. A verdadeira inteligência urbana não reside apenas nos seus dispositivos digitais, mas na sua capacidade de regenerar o vínculo humano com o mundo vivo.
Além de mitigar os efeitos das alterações climáticas — reduzindo temperaturas, melhorando a qualidade do ar e ampliando a biodiversidade —, os espaços verdes atuam como catalisadores de inclusão social, saúde pública e justiça espacial.
Esta comunicação propõe uma reflexão crítica sobre o papel dos espaços públicos verdes na interseção entre biofilia, estética urbana e big data, defendendo que equilibrar tecnologia e natureza é fazer da cidade uma verdadeira plataforma de cuidado com os direitos humanos e com todas as formas de vida.
Destinatários
Estudantes, docentes e interessados em geral
Preçário
Associados com quotas em dia: 22€
Não Associados: 27€
Estudantes, com comprovativo de matrícula: 6€
Certificação
Formação a acreditar na modalidade de Formação de Curta Duração, para efeitos da carreira docente (apenas para docentes em exercício de funções confirmável por uma escola pública ou privada do sistema de ensino não superior português), com a duração de 3h.
Para obter esta acreditação, será necessário o registo na plataforma do CFAE Beira Mar.
A Apf fornecerá ao CFAE Beira Mar as informações necessárias para a emissão dos certificados de formação, que se encontrarão, no final do processo, na área reservada de cada formando, na conta de docente, na plataforma do Centro de Formação, em “Histórico”.
Emissão de certificados de presença, pela Apf, para os que não reúnam condições ou não pretendam certificação de curta duração.
Palestrantes
António Manuel Rochette Cordeiro, Doutor em Geografia e Professor do Departamento de Geografia e Turismo da Universidade de Coimbra – 1º Ciclo de Estudos, Mestrado e Doutoramento em Geografia e Estudos do Ordenamento do Território e do Ambiente – e do Mestrado Integrado do Departamento de Arquitetura. Tem proferido diversas conferências no âmbito dos Programas de Doutoramento em Estudos Contemporâneos (CEIS20) e em Ciências da Educação. Investigador Integrado do Centro de Estudos Interdisciplinares (CEIS20-IIIUC), centro do qual foi Coordenador Científico entre 2016 e 2021.
No quadro de uma diversidade de caminhos seguidos na investigação, nomeadamente, Espaços Urbanos Sustentáveis, Desenvolvimento Sustentável, Condicionantes Biofísicas em Urbanismo, Topo e Microclimatologia, bem como de Políticas Públicas – Educação e Ordenamento do Território, Planeamento de Equipamentos Coletivos – publicou cerca de três centenas de livros, capítulos de livros, artigos, notas técnicas e relatórios, num contexto interdisciplinar desde há muito assumido.
A participação em conferências nacionais e internacionais levou ao estabelecimento de várias redes internacionais, que conduziram a duas candidaturas europeias bem-sucedidas: ‘H2020 URBiNAT – Healthy corridors as drivers of social housing neighbourhoods for the co-creation of social, environmental and marketable – NBS (líder do parceiro Universidade de Coimbra) e o projeto Erasmus+ “CoReD” Collaborative Re-design with Schools. Em termos de Projetos de Transferência de Conhecimento para a comunidade – Extensão Universitária, desde 2004 coordenou mais de oito dezenas de projetos estratégicos – ordenamento do território e urbanismo; educação; ação social; desporto -, tudo isto no âmbito de protocolos estabelecidos entre a Universidade de Coimbra e os Governos de Portugal e dos Açores, bem como municípios portugueses.
David Afonso (1973), licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP), possui pós-graduações em Estudos Locais e Regionais (FLUP) e em Cidades e Culturas Urbanas pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC).
Professor do ensino secundário e ativista em questões urbanas, é fundador da Associação Portuguesa para a Reabilitação e Proteção do Património (APRUPP) e cofundador do atelier Floret Arquitectura, especializado em Reabilitação Urbana.
Paula Cristina Pereira é Professora Associada do Departamento de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde leciona Antropologia Filosófica; Tópicos de Filosofia Política; Educação Filosófica e Desenvolvimento Social; Espaço Público: Temas e Problemas (na Licenciatura, em dois Mestrados e no Programa Doutoral). Foi diretora do Mestrado em Ensino de Filosofia, diretora do Programa Doutoral em Filosofia, assim como membro e vice-presidente do Conselho de Ética da Universidade de Aveiro. Tem sido professora convidada em várias universidades estrangeiras e integrado projetos internacionais (ex: ETHNA – Ethics Governance System / Bioética Cordial y Democracia Algorítmica / The Just City -URBS).
É Investigadora Principal do GI Filosofia e Espaço Público do Instituto de Filosofia (UI&D) e membro da respetiva Comissão Executiva. A sua investigação desenvolve-se nas áreas da Filosofia da Cidade, da Filosofia Social e Política e da Antropologia Filosófica. Temas e conceitos principais: condição humana e condição urbana; bem comum e bens comuns; espaço público, cidade e comum; justiça espacial. Criou (2020) e coordena a Rede Internacional de Filosofia e Espaço Público (PaPSIN).
Entre 8 livros, 6 números monográficos (a convite) de revistas internacionais, capítulos de livros e artigos em revistas (nacion. e intern.), destacam-se as publicações mais relevantes dos últimos anos: “Common Good”, in Paula C. Pereira (coord.) Philosophy of City. Ethical and Political Challenges, Volume 1: Common Good. Porto, UP Press (em preparação, 2025) / “City, Public Space and Political Action” (coautoria), in Francisco Colom-González (ed.) Urban Justice. Debating Spatial Exclusion, Common Goods and the Built Environment, Springer, 2024 / Revista Arbor CSIC, vol. 198, nº. 803-804, (editora convidada), “Nuevos sujetos políticos en la postmetrópolis”, 2022 / Recerca Revista de Pensament i Anàlisis, nº. 25, (editora convidada),”Filosofía de la ciudad: un enfoque interdisciplinar”, 2020 / “Outros Espaços e Urbanidades Periféricas” (coautoria), in Casero, & Urabayen, Differences in the City: Postmetropolitan Heterotopias as Liberal Utopian Dreams, Nova Science Publishers, New York, 2020 / “City and common space”, in Meagher, S., Noll, S. & Biehl, J. (eds), The Routledge Handbook on Philosophy of the City, Routledge, 2019 / “Philosophy of the city”, in Pereira, P. C. & Couto, M. J. (orgs.), Philosophy, City and Public Space, Afrontamento, 2018.

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