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Filosofia, religião e sociedade | ENPF 2022

A Apf – Associação de Professores de Filosofia e a SPF – Sociedade Portuguesa de Filosofia – organizam o Encontro Nacional de Professores de Filosofia 2022, a decorrer online através da plataforma de videoconferência Zoom, no dia 15 de outubro, sob o tema Filosofia, Religião e Sociedade.

 

Este Encontro convida à reflexão sobre o ensino de filosofia da religião, tanto nos seus aspetos didáticos como nas dimensões de maior repercussão social. Problemas globais do nosso tempo como o fundamentalismo podem ser pensados à luz da ausência da atividade interrogadora e de pensamento crítico que caracteriza a filosofia. Numa era em que as religiões, longe de mortas, até ganham uma nova comparência na vida das sociedades, influindo nos modos por que estas se organizam, mesmo politicamente, há uma justificação acrescida para a atenção filosófica à questão da religião, seja nos seus tópicos tradicionais ou outros temas emergentes na relação com a etapa histórica de transições e mudanças que vivemos.

 

PROGRAMA

Manhã

09h15 – Receção dos participantes e palavra de boas-vindass

09h30 – A argumentação e os limites da persuasão racional na filosofia da religião, por Aires Almeida (Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes, Portimão)

10h30 – O problema da diversidade religiosa, por Domingos Faria (Faculdade de Letras da Universidade do Porto)

11h30 – Intervalo

11h45 – Deus: argumentos para um ateísmo amigável 2.0, por Manuel João Pires (Agrupamento de Escolas Dr. Ginestal Machado)

 

12h45 – Almoço

 

Tarde

14h30 – A vulnerabilidade como lugar de encontro. A abordagem de Michel Henry no centenário do seu nascimento, por Andreas Gonçalves Lind (Universidade Católica Portuguesa)

15h30 – Nietzsche versus Habermas. Genealogias da razão, por Jesús Conill (Universidade de Valência)

 

Frequência aberta a estudantes, docentes e não docentes e interessados em geral, com comprovativo de presença através da emissão de certificados.

A documentação do congresso, o certificado e a oferta de um livro de filosofia serão enviados por correio postal para o endereço fornecido no ato de inscrição.

 

Sob o formato de congresso, este evento será proposto para acreditação para efeitos da carreira docente, pelo CFAE Beira Mar, na modalidade de formação de curta duração (6h). Esta certificação é aplicável apenas a docentes em exercício de funções no sistema de ensino português. A emissão e envio dos certificados será efetuada pelo CFAE Beira Mar, por correio eletrónico, para o endereço fornecido no ato de inscrição.

 

Resumo das comunicações

A argumentação e os limites da persuasão racional na filosofia da religião, por Aires Almeida

Alguns filósofos contemporâneos, como Julian Baggini, têm revelado algum ceticismo sobre a eficácia da argumentação racional nos debates centrais de filosofia da religião. Justificam o seu ceticismo com o facto de muito raramente os próprios filósofos da religião, mesmo os que mais reconhecem a importância e a força das razões, terem mudado as suas convicções religiosas fundamentais com base em argumentos racionais. Mudar de convicções religiosas fundamentais não é assim tão comum e ainda menos comum é isso ocorrer como resultado de algum argumento ou razão incontestável, pelo que os debates académicos sobre questões fundamentais da filosofia da religião raramente se traduzam numa mudança de ideias entre as partes debatentes. De que serve, então, o debate racional nestas matérias, uma vez que a sua eficácia persuasiva parece praticamente nula? E, nesse caso, de que serve discutir nas aulas de Filosofia os argumentos a favor ou contra a existência de Deus?

Defenderei que o ceticismo sugerido por Baggini não se justifica e que a persuasão racional não é uma questão de tudo ou nada; que ela não é uma questão de manter ou abandonar convicções básicas. Neste sentido, as convicções podem ser falsas e, ainda assim, umas serem mais racionais do que outras. Assim, tornar as suas crenças básicas mais racionais nem sempre significa abandoná-las quando desafiadas por argumentos que os próprios consideram fortemente persuasivos. No entanto, torná-las mais racionais contribui para evitar formas nocivas de intolerância e fundamentalismo.

 

O problema da diversidade religiosa, por Domingos Faria

Nesta comunicação queremos abordar o problema da diversidade religiosa. Essa diversidade é ampla; pois, além de agnósticos, ateus, e teístas, se focarmos a atenção nestes últimos, destacam-se diferentes religiões particulares com crenças incompossíveis. Será que as crenças religiosas podem ser racionais num tal contexto de testemunhos contraditórios sobre alegações religiosas? Como resposta negativa a este problema, pode-se argumentar que essa diversidade e desacordo generalizado constitui uma ameaça à racionalidade das crenças religiosas. Nomeadamente, seguindo Goldberg (2021), pode-se defender que esse desacordo dá a cada um de nós uma boa razão para pensar que o seguinte é o caso: as perspetivas de que se tenha chegado à verdade em domínios de crenças religiosas sistematicamente contestadas não são boas. A ideia de Goldberg é que a diversidade e o desacordo entre crenças religiosas constituem um derrotador para a racionalidade das crenças religiosas. Esse argumento pode ser resumido desta forma: Uma crença de um sujeito S que p é racional só se S não tem boas razões para considerar que p não foi formada de um modo fiável. Mas, tendo em conta a diversidade e o desacordo religiosos, há boas razões para se considerar que as crenças religiosas não foram formadas de um modo fiável. Logo, nessa base, as crenças religiosas não são racionais. O nosso objetivo é analisar a solidez deste argumento de Goldberg. Como tentativa de resistir a esse argumento vamos recorrer ao recente quadro teórico da epistemologia social das virtudes, tal como desenvolvida por Greco (2021) e Sosa (2021).

 

Deus: argumentos para um ateísmo amigável 2.0, por Manuel João Pires

Nesta comunicação, propomos-vos uma viagem filosófica, simultaneamente polémica e didática, sobre o problema da existência de Deus, em que desenvolveremos uma linha argumentativa a favor do ateísmo amigável. Partindo de uma explicitação do que entendemos por “Deus”, iremos colocar a seguinte questão: existem razões suficientes para considerar injustificada a crença na existência de Deus? Defenderemos a tese de que existem razões para considerar a crença em Deus injustificada, mas não irracional. A nossa reflexão centrar-se-á no problema do mal e, num primeiro momento, procuraremos mostrar que é possível superar o problema lógico do mal através de uma versão modificada da teodiceia leibniziana do melhor dos mundos possíveis. De seguida, através da análise das experiências de pensamento do “dormitório”, proposta por Simon Blackburn, e do “Corço”, proposta por William L. Rowe, será nosso intento mostrar que o problema indiciário do mal, não obstante respostas como as que são propostas pelo teísmo cético, coloca a justificação da crença na existência de Deus em muito maus lençóis. Não obstante os estragos que o problema indiciário do mal provoca na justificação da crença na existência de Deus, terminaremos a nossa viagem filosófica argumentando que alguns teístas, apesar de não terem justificação suficiente para a crença na existência de Deus, não são irracionais na sua crença. Por outras palavras, procuraremos mostrar que um ateísmo hostil ou mesmo um ateísmo indiferente não são racionalmente justificados, pelo que temos boas razões para subscrevermos uma versão 2.0 do ateísmo amigável.

 

A vulnerabilidade como lugar de encontro. A abordagem de Michel Henry no centenário do seu nascimento, por Andreas Gonçalves Lind

No dizer de Michel Henry (1922-2002), foi com Nietzsche que “o Ser recebeu pela primeira vez o significado de ser vida”. A dimensão afetiva do ser humano irrompeu, assim, sem pudor e de forma significativa, no terreno próprio do filosofar. E o primado da Razão universal, que havia marcado os autores da época moderna, acabou por ser posto em causa. No entanto, ao separar as pessoas humanas entre “os fortes” e “os fracos”, a narrativa de Nietzsche ainda estimula em nós o desejo de autonomia, tal como a ambicionavam os filósofos modernos. Além disso, o querer nietzschiano de controlar o mundo e de nele realizar os próprios desejos faz-se acompanhar pela renúncia a um qualquer Deus do qual um sujeito humano possa depender. Com Nietzsche, não foi só a renúncia a Deus que se intensificou. Foi uma nova antropologia que acabou por se impor no nosso horizonte, onde a fraqueza, a vulnerabilidade e a dependência da condição humana são vistas com o desdém de quem as quer superar. É neste contexto que Michel Henry nos propõe uma outra visão da vulnerabilidade. Em vez de constituir uma condição que devemos superar, a vulnerabilidade manifesta-se como condição de possibilidade da comunhão que permite o pleno florescimento da vida que nos habita. Só assim será possível estabelecer uma relação com Deus sem pagar o preço da alienação da própria vida.

 

Nietzsche frente a Habermas. Genealogías de la razón, por Jesús Conill

Se trata de presentar una apasionante confrontación entre Nietzsche y Habermas, entre la genealogía de la razón corporal y la de la razón comunicativa, para desvelar las raíces corporales y religiosas de la razón humana.

En su última etapa Habermas descubre explícitamente que en los orígenes de la razón se encuentra la imaginación religiosa y que las huellas de lo sagrado perduran hasta en la razón moderna, cuyo déficit motivacional reclama los vínculos religiosos.

Tanto Nietzsche como Habermas reconstruyen la gestación histórica de la razón a partir de la experiencia vital y su progreso mediante procesos de aprendizaje, que han conducido a una religión racionalizada en la perspectiva de Habermas y a una experiencia trágica en el diagnóstico cultural de Nietzsche.

 

Palestrantes

Aires Almeida é professor na Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes, em Portimão. Mestre em Filosofia pela Universidade de Lisboa e membro do Centro de Filosofia da mesma universidade. É autor e coautor de vários livros de filosofia, entre os quais “O valor cognitivo da arte” e “Janelas para a Filosofia” e de manuais escolares de Filosofia.

 

Andreas Gonçalves Lind é Professor Auxiliar da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Católica Portuguesa – Centro Regional de Braga. Licenciado em Economia, Teologia e Filosofia, conclui o doutoramento em Filosofia pela Université de Namur (Bélgica) em 2020. Os seus interesses de investigação focam-se, sobretudo, na filosofia da religião e na interdisciplinaridade entre a fenomenologia e as ciências humanas.

 

Domingos Faria é Professor Auxiliar de Filosofia na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. As suas principais áreas de investigação são epistemologia social e filosofia da religião. O seu currículo e as suas publicações científicas estão disponíveis no website https://dfaria.eu.

 

Jesús Conill é professor de Filosofia Moral na Universidade de Valência. Faz investigação nas Universidades de Munique, Bona, Frankfurt, St. Gallen e Notre Dame. É membro da Fundação ÉTNOR (para a ética das empresas e organizações), do Seminário de Investigação Xavier Zubiri, da Rede Internacional de Ética do Discurso, da GIRN e da HyperNietzsche. As suas publicações incluem os seguintes livros: “El crepúsculo de la metafísica” (Anthropos, 1988), “El enigma del animal fantástico” (Tecnos, Madrid, 1991), “El poder de la mentira. Nietzsche y la política de la transvaloración” (Tecnos, 1997), “Horizontes de economía ética” (Tecnos, 2004), “Ética hermenéutica” (Tecnos, 2006), “Intimidad corporal y persona humana. De Nietzsche a Ortega y Zubiri” (Tecnos, 2019), e “Nietzsche frente a Habermas. Genealogías de la razón” (Tecnos, 2021).

 

Manuel João Pires é, desde 1998, professor de filosofia no ensino secundário. Licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com conclusão da parte curricular do Doutoramento em Filosofia. Participou em colóquios nacionais e internacionais, tendo vários trabalhos publicados, o último dos quais What would it be like to be other than me? Some Notes on Personal Identity, no international eJournal philosophy@LISBON. Fez parte da direção da SEA – Sociedade de Ética Ambiental e integra os órgãos sociais da associação O Que é?. De 2015 a 2022 foi Presidente da PROSOFOS (Associação para a Promoção da Filosofia) e assumiu a presidência da comissão organizadora das XXX Internacional Philosophy Olympiad, realizadas em Lisboa, de 26 a 29 de maio de 2022.

 

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